Podstrony
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128 Almeida Garrett nos braços da inocente que lhos abria num santo êxtase do mais apaixonado amor; no segundo, tremeu e teve horror da sua felicidade. Joana exclamou ele Joana querida, sabes tu se eu mereço... Sabes tu se deves?... Sei. Desde que me entendo, não pensei noutra coisa; desde que daqui foste, comecei a entender o que pensava... disse-o à minha avó, e ela... E ela?.. Ela abençoou-me, chamou-me a sua querida filha, abraçou-me, beijou-me, e disse-me que aquela era a primeira hora de felicidade e de alegria que há muitos anos tinha tido. Carlos não respondeu nada e olhou para Joaninha com uma indizível expressão de afecto e de tristeza. Os raios de alegria que resplandeciam naquele semblante agora belo de toda a beleza com que um verdadeiro amor ilumina as mais desgraciosas feições os raios dessa alegria começaram a amortecer, a apagar-se. A lúcida transparência daqueles olhos verdes turvou-se: nem a clara luz da água-marinha, nem o brilho fundo da esmeralda resplandecia já neles; tinham o lustro baço e morto, o polido mate e silicioso de uma dessas pedras sem água nem brilho que a arte antiga engastava nos colares de suas estátuas. Adeus, Joana! disse Carlos perturbado e confuso. Adeus, Carlos! respondeu ela maquinalmente. Até depois de amanhã, Joana. Pois sim. Depois de amanhã te direi... Não digas. Por quê? Porque é escusado: já sei tudo. Sabes! Sei. O quê? O que tu não tens ânimo para me dizer, Carlos: mas que o meu coração adivinhou. Tu não me amas, Carlos. 129 Viagens na Minha Terra Não te amo! eu!... Santo Deus, eu não a amo.... Não. Tu amas outra mulher. Eu! Joana, oh! se tu soubesses... Sei tudo. Não sabes. Sei; amas outra mulher, outra mulher que te ama, que tu não podes, que tu não deves abandonar, e que eu... Tu? Eu sei que é bela, prendada, cheia de graças e de encantos, porque... porque tu, meu Carlos, porque o teu amor não era para se dar por menos. Joana, Joaninha! Não digas nada, não me digas nada hoje... hoje sobretudo, não me digas nada. Amanhã... Amanhã é sexta-feira. Inda bem! Terei mais tempo para reflectir, para considerar antes de tornar a ver-te. Adeus, Carlos! Uma palavra só, Joana. Cuidas que sou capaz de te enganar? Não; estou certa que não. Até amanhã... até depois de amanhã. Adeus! Abraçaram-se, e desta vez froixamente; beijaram-se de um ósculo tímido e recatado... os beiços de ambos estavam frios, as mãos trémulas; e o coração comprimido batia, batia-lhes tão forte que se ouvia. Retirou-se cada um por seu lado. A noite estava pura e serena como na véspera, as estrelas luziam no céu azul com o mesmo brilho; o silêncio, a majestade, a beleza toda da natureza era a mesma... só eles eram outros... outros, tão outros e diferentes do que foram! Tinham-se dado cuidadosamente as providências; ambos chegaram, sem nenhum acidente, ao seu destino. 130 Almeida Garrett CAPÍTULO XXVI Modo de ler os autores antigos, e os modernos também. Horácio da Sacravia. Duarte Nunes iconoclasta da nosso história. A polícia e os barcos de vapor. Os vândalos do feliz sistema que nos rege. Shakespeare lido em Inglaterra a um bom fogo, com um copo de old-sack sobre a banca. - Sir John Falstaff se foi maior homem que Sancho Pança? Grande e imponente descoberta arqueológica sobre S. Tiago, S. Jorge e Sir John Falstaff. Prova-se a vinda deste último a Portugal. O entusiasta britânico no túmulo de Heloísa e Abelardo no Père-Lachaise. Bentham e Camões. Chega o Autor à sua janela, e pasmosa miragem poética produzida por umas oitavas dos Lusíadas. De como enfim prosseguem estas viagens para Santarém, e que feito será de Joaninha. Se eu for algum dia a Roma, hei de entrar na cidade eterna com o meu Tito Lívio e o meu Tácito nas algibeiras do meu paletó de viagem. Ali, sentado naquelas rumas imortais, sei que hei de entender melhor a sua história, que o texto dos grandes escritores se me há-de ilustrar com os monumentos de arte que os viram escrever, e que uns recordam, outros presenciaram os feitos memoráveis, o progresso e a decadência daquela civilização pasmosa. E Juvenal e Horácio? o meu Horácio, o meu velho e fiel amigo Horácio!... Deve Ser um prazer régio ir lendo pela Sacravia fora aquela deliciosa sátira, creio que a nona do liv. I, Ibam forte sacra via, sicut meus est mos Nescio quid meditans nugarum... Deve ser maior prazer ainda, muito maior do que beijar o pé ao Papa. Parece-me a mim; mas como eu nunca fui a Roma... E não é preciso. Pegue qualquer na bela Crónica del-rei D. Fer- nando, a que Duarte Nunes menos estragou... 131 Viagens na Minha Terra O Duarte Nunes foi um reformador iconoclasta das nossas crónicas antigas, truncou tocas as imagens, raspou toda a poesia daquelas vene- randas e deliciosas Sagas portuguesas... Em ponto histórico pouco mais eram do que Sagas, verdade seja, mas, como tais, lindas. E o Duarte Nunes, que era um pobre gramaticão sem gosto nem graça, foi-se às filigranas e arrendados de finíssimo lavor gótico daqueles monumentos, quebrou-lhos; ficaram só os traços históricos que eram muito pouca e muito incerta coisa: e cuidou que tinha arranjado uma história, tendo apenas destruído um poema. Ficamos sem Niebelungen14, podendo-o ter, e não obtivemos história porque se não podia obter assim. Pois digo: pegue qualquer na bela Crónica del rei D. Fernando, obedeça á lei concorrendo com o seu cruzado-novo para o aumento e glória da benemérita companhia que tem o exclusivo desses caranguejos de vapor que andam e desandam no rio, entre num dos referidos ca- que ranguejos, em , além da porcaria e mau cheiro, não há perigo nenhum senão o de rebentar toda aquela câmara óptica que anda por arames, e que em qualquer pais civilizado, onde a polícia fizesse alguma coisa mais do que imaginar conspirações, há muito estaria condenada a ir ali caranguejar para as Lamas15 á sua vontade. Mas, enfim, cá não há doutros nem haverá tão cedo, graças ao muito que agora, dizem, que se cuida dos interesses materiais do pais: e portanto tome o seu lugar, passe o mesmo que eu passei; chegue-me a Santarém, descanse e ponha-se-me a ler a Crónica: verá se não é outra coisa, verá se diante daquelas preciosas relíquias, ainda mutiladas, deformadas como elas estão por tantos e tão sucessivos bárbaros, estragadas enfim pelos piores e mais vândalos de todos os vândalos, as autoridades administrativas e municipais do feliz sistema quê nos rege, ainda assim mesmo não vê erguer-se diante de seus olhos os homens, as cenas dos tempos que foram; se não ouve falar as pedras, bradar as inscrições, levantar-se as estátuas dos túmulos; e reviver-lhe a pintura toda, reverdecer-lhe toda a poesia daquelas idades maravilhosas! Tenho-o experimentado muitas vezes: é infalível. Nunca tinha entendido Shakespeare enquanto o não li em Warwick ao pé do Avon,
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